terça-feira, 2 de dezembro de 2014

CARTA DO PASSADO PRO FUTURO

Cá estou, te escrevendo essa carta ainda que eu não a conheça, para lhe dizer que da mesma forma que a vida sorriu pra mim quando me trouxe de presente ele, hoje sorri pra você.

Ele é cheio de manias, adora gesticular como quem está brigando na rua, fala alto e fica bravo se você o corrige; adora comer porcarias, todo fim de semana vai te levar pra algum lugar.

Sim, ele adora sair.
Adora coisas novas, lugares novos, saídas sem rumo.

Talvez eu tenha falhado um pouco nisso, meu jeito metódico sufocava esse jeito livre dele de ser. Ele é desses que gosta de acordar num sábado de manhã, vestir uma camiseta rosa - não, não foi coincidência ele ter usado roupa de diferentes tipos de rosa, o armário dele é cheio dessa cor -, pôr os fones de ouvido e caminhar sem pensar no que fará mais tarde. Caminhar, andar de bicicleta, jogar futebol, respirar ar puro... viver.

Lógico que ele é cheio de defeitos, vai te dar bronca no momento mais impróprio, talvez feche a cara quando você mais precisar de um sorriso dele. Mas também vai bater na porta da sua casa com um buquê de flores e te pedir perdão, te dar um abraço de urso e sorrir com os olhos marejados de criança sem abrigo. Criança que quer se abrigar num abraço teu.

Ouça-o. Ele sempre terá muito o que dizer, suas conversas nunca serão monótonas. Ele transpira ideias e você será parte fundamental nelas, então ajude-o. Mas só ajude se tiver gosto em fazê-lo, caso contrário, ele se vira bem sozinho.

Bem provável que você se irrite com as brincadeiras de ogro que ele tem, mas não é por mal, ele realmente acha que suas forças são iguais.

Não se assuste se ele lhe enviar cartas, ele aprendeu isso quando ainda éramos amigos e pegou o gosto por expressar o sentimento em palavras. Releve a letra, ele sempre escreve quase dormindo ou acordando pela manhã.

Não se preocupe se no dia seguinte ele já tiver outra grande ideia pro futuro. Ele tem um coração sonhador, mas põe em prática tudo que sonha, ainda que não leve até o fim.

E ah, ele não vai falar. Não adianta pressionar! Depois de uma briga é capaz de você falar durante uma hora inteira sozinha e ele só vai abrir a boca quando sentir que deve ou tem algo a dizer. O máximo que vai fazer é pedir desculpas e assumir o erro, ele não é orgulhoso. Não muito.

Pode ser bem mais fácil pra você entrar de cabeça agora, mas se fosse eu no seu lugar, não aceitaria essas dicas por nada nesse mundo. Nada foi melhor que poder descobrir tudo isso tendo a experiência de vivê-las. E re-descobrir, re-fazer, re-criar, re-amar.

Porque quando não dava certo a gente voltava duas casas e re, outra vez.

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

ALMA CIGANA

É verdade que eu o amo e não tenho dúvidas do amor do mesmo por mim, já demonstrou diversas vezes que eu não precisava ter insegurança quanto a isso. Mas também é bem verdade que ele é despojado com a vida, nunca foi de se prender em lugar algum e achei injusto mantê-lo aqui em terra firme, enquanto sua cabeça pairava no mar.

É certo que o Zé queria ficar aqui, ao meu lado, mas é certo também que eu já não o sentia tão perto assim há tempos. E não por me amar menos, apenas por amar o mar tanto quanto amava à mim. Eu não sou dessas que pede pra ficar ou implora por amor, acho que o amor quando é verdadeiro é dado livremente, vem pra libertar e não pra prender.

E o Zé... bom, o Zé já não era livre há muito tempo. Eu nunca precisei de muito pra fazê-lo feliz, ele é desses caras simples que se contentam com um amor tranquilo, uma água de coco e um pôr-do-sol visto de dentro de um barco em alto mar.

Outro dia conversando com ele cheguei a conclusão que sua alma era cigana, ele não nasceu pra plantar os pés sobre a terra e ficar durante muito tempo ali. Ele veio ao mundo pra fazer história com seus próprios pés.

E eu o deixei ir, com um sorriso no rosto e um beijo estalado na testa ele partiu, acompanhado de um "se cuida, meu rei" ele entendeu que meu coração é dele, mas o dele é do mundo inteiro. Eu entendi que amar é deixar ir. Nem sempre o que é bom pra você, será bom pro outro. Às vezes é preciso escolher e eu escolhi por ele, porque nada me dói mais que assistir de perto àqueles olhinhos cheios de sonhos enterrados na areia da vida.

sábado, 12 de julho de 2014

O CAFÉ ESFRIOU. E VOCÊ TAMBÉM.

Fiz todos meus afazeres logo pela manhã e quando me dei conta, o café havia esfriado; o vento cessado e em breve me daria conta que o amor; Ah, o amor... havia se perdido em meio a tantas idas e vindas.

— Podemos conversar? - quando ouvi isso automaticamente meus olhos se reviraram. Não por falta de querer, apenas por estar desacreditada que ainda faria alguma diferença. Afinal, quantas conversas mais eram precisas?

— Acha mesmo necessário, Henrique? - indaguei.

Continuei a mexer em papéis enquanto ele tentava remexer em coisas que me trariam mais problemas que toda aquela poeira dentro da minha gaveta. Ele queria mexer em sentimentos antigos, perfurando histórias a dentro que só me faziam sentir desânimo para prosseguir ao seu lado. O pior era ele não perceber, não entender, não querer ver o real problema.

Suspirei. De nada adiantavam todos os sermões, diálogos, horas a fio em explicações. Pois o primeiro passo para chegar a algum lugar é decidir que não está mais disposto a ficar onde está e certamente há tempos não saíamos do mesmo lugar: o egoísmo do nosso querer acima de qualquer outro.

E assim, me decidi. Primeiro entendi que não merecíamos alguém pela metade com meias verdades, meias entregas e meio coração. Ou seria tudo, ou era melhor que não houvesse nada. Entendi que não é justo comigo e com ninguém, pois dar-se pela metade é como um café que esfriou naquela tarde fria: quando mais precisava, não se teve.

Dei um fim nesse meio relacionamento. Não foi fácil, foi necessário jogar muita coisa velha e acumulada no lixo, para que eu conseguisse recomeçar sem estar pela metade. E hoje me vi por inteira, como há muito não me sentia.

Porque por muitas vezes pular fora do barco não é sinal de fraqueza, é entender que a dor pode ser menor por outros caminhos.