domingo, 26 de julho de 2015

QUERIA EU MORAR NUM ABRAÇO

Estávamos numa festa, olhei-o; percebi que o mesmo já me encarava, virei-me sem graça. Voltei a olhá-lo, ele percebeu e como numa fração de segundos virou-se em minha direção, sorrimos antes que desse tempo de uma segunda virada de cabeça. Aquele momento implorava por uma troca maior que apenas olhares, meu pensamento insistia em querer conhecer mais a fundo aquele que tanto me intrigava, e eu não sabia nem mesmo seu nome.

Essa noite poderia terminar de três diferentes formas:
1. Em arrependimento! Sorrio e saio de fininho;
2. Num beijo e possível troca de números do WhatsApp;
3. Num quarto, longe dali.

Mas jamais terminaria:
1. Num abraço.

Abraço é muito démodé. A graça é conhecer rápido, falar pouco e beijar muito. Raramente uma troca de mensagens no dia seguinte. A graça é sentarmos numa mesa e ao invés de trocarmos histórias e gargalhadas, trocarmos wifi nos iludindo estarmos "juntos". Abraço, quê é isso mesmo?

Beijo é bom, não disse o contrário. É calor, conexão, encontro, intimidade. Mas não há nada mais íntimo que poder dar-se num abraço. Queria eu morar num abraço! Viver dentro do refúgio que é abrigar-se em alguém. Abraço é encontro de alma e espírito, é deparar-se com o coração do outro; é casa pra se morar.

E quando encontramos essa casa, kitnets já não nos satisfazem mais.

segunda-feira, 22 de junho de 2015

NO ÔNIBUS

Lá estava eu, sentada no banco do ônibus enquanto viajava pra longe com a música que destrinchava meus tímpanos de tão alta. Meus pensamentos se anexavam a batida da música. Cachorro, faculdade - parada rápida pra tocar a bateria imaginária junto ao som de Led Zeppelin -, trabalho, provas, curso de inglês na quarta e o chopp com a galera no sábado.

Em meio a lista flutuante e imaginária que criava, olhava de rabo de olho para quem entrava ou saía do ônibus, não por medo, apenas para saber se algum "vovô" ou "doninha" entrariam e precisariam de meu assento.

Até que entre uma dessas rápidas olhadas, voltei-me rapidamente a pessoa em que avistei. Sorri ao vê-lo sorrindo feliz para um bebê que estava no colo de sua mãe e foi isso que me chamou atenção no mesmo. Ele sentiu o olhar e virou-se pra mim rapidamente, fazendo-me não ter tempo de voltar meu olhar. Então encarei. Sem graça, me virei. Mas continuava incomodada, era como um imã que fazia voltar meus olhos à ele e sutilmente ele voltava os seus à mim.

Comecei a prestar mais atenção nele. De terno, claramente um executivo -o que me fazia perguntar a mim mesma o por quê de estar andando em transporte público tão elegante daquela forma-, com um sorriso belíssimo que transparecia ingenuidade apesar da idade. E que idade! Era mais velho. E isso não me incomodava nem um pouco, pelo contrário, até me instigava.

E fiquei ali, imaginando como seria se ao invés de em pé ele sentasse no banco ao lado e puxasse papo: será que era um cara tão interessante quanto aparentava de longe?

E no meio de todos esses pensamentos: - trriiiiiimm! - alguém tocou a campainha do ônibus. Era ele. Antes de descer, virou-se em minha direção e me encarou como quem dizia "até logo", retribuí com um sorriso.

Até hoje não sei o tom de sua voz, ou seu nome, ou o que faz da vida... Sei apenas aquilo que minha imaginação criou. A única certeza que carrego é que gosta de crianças e que é dono de um sorriso hipnotizante. 

Até prefiro esse desfecho. Afinal, melhor que ele permaneça em minha memória como alguém que em pouco menos de 20 minutos me fez lembrá-lo por anos ao invés de alguém que pude ter durante anos e queria que fosse apenas por 20 minutos.

quinta-feira, 7 de maio de 2015

QUE SEJA

que seja simples. seja imenso. repleto.
que seja cheiro. afago. carinho.
que seja vírgula. reticências.
que seja história. memória. lembrança.
que seja hoje. ontem. amanhã.
que seja explosivo. comedido. cauteloso.
que seja abraço. beijo. partida.
que seja quente. frio. morno.
que seja foto. carta. ligação.
que seja borboleta. embrulho no estômago.
que seja grito. alegria. tristeza.
que seja tradição. que seja o novo. que seja doce.
e mesmo que não seja eterno,
QUE SEJA!
não é conto.

domingo, 19 de abril de 2015

NADA

Me fitava como se soubesse o que se passava em minha cabeça. Desviava todo o tempo seu olhar. Olhar cheio de perguntas, procurando achar respostas no meu. Eu repetia que nada havia, em vão. Ele continuava a perguntar.

Eu, repleta de sentimentos inquebrantáveis por aquele Ser, precisava manter-me firme quanto sua partida. Eu disse que não me permitiria chorar mais uma vez por alguém que desejasse ir embora assim, afinal, a vida é feita de escolhas. Mas ele insistia, parecia não compreender.

E por fim, disse nada haver - tentando deixar claro não só a ele, mas à mim.

Não há nada.
Nada.
Porém, um nada tão cheio de tudo.

domingo, 5 de abril de 2015

EU PODERIA

Eu poderia te ligar agora. Te convidar pra um café quente, ou uma cerveja gelada. Poderia mandar um e-mail te contando as novidades, perguntando sobre o trabalho ou a faculdade. Mais que isso, poderia aparecer na porta do teu trabalho. Te raptar no meio da noite, te levar pra ver o brilho da lua ou sentir a brisa do mar. Poderia. Poderia lhe dizer o quanto faz falta, o quanto eu quis que déssemos certo. O quanto eu tentei e o quão difícil foi ter que abrir mão de você, de nós. Poderia, poderia sim. Poderia fazer isso agora, sei exatamente o horário que chega e sai de casa. Poderia aparecer lá, inventar qualquer desculpa só pra ter a oportunidade de ver seu sorriso mais uma vez. Poderia te enviar uma carta, dessas que costumava escrever, com poucas palavras carregadas de muito sentimento. Poderia. Poderia hoje, poderia agora. Porque durante muito tempo você foi a solução. Mas aí você resolveu ser o problema. E eu deixei de poder, pois já não valia mais a pena.